A Justiça Militar decretou nesta quinta-feira (5) a prisão do policial apontado como o responsável por jogar um entregador de uma ponte na Zona Sul de São Paulo, no último domingo (1°).

O soldado Luan Felipe Alves Pereira já tinha ficado detido após prestar depoimento na Corregedoria da Polícia Militar.

Agora, com a decretação da prisão, ele será encaminhado para o Presídio Militar Romão Gomes, na Zona Norte da capital paulista, após realização de exames no IML. A reportagem tenta contato com a defesa dele.

 

Cenas chocantes

O caso aconteceu na Vila Clara, região de Cidade Ademar, na noite de domingo (1°), durante a dispersão de um baile funk.

O soldado foi flagrado atirando o rapaz da ponte sem nenhum motivo ou resistência aparente.

A vítima se chama Marcelo, tem 25 anos e é entregador. Ele caiu de cabeça de uma altura de três metros, teve ferimentos, mas passa bem. Marcelo recebeu ajuda de pessoas que moram na região.

O pai dele se disse indignado com o episódio e exigiu explicações das autoridades do estado, ligadas à gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). Em entrevista ao Jornal Nacional, Antonio Donizete do Amaral disse que Marcelo, não tem passagem pela polícia.

 

"Ele está bem, mas não conseguimos falar com ele. É inadmissível, não existe isso aí. A polícia está aí para fazer a defesa da população, não fazer o que fez. Trabalhador [o filho], menino que sempre correu atrás do que é dele. Não tem envolvimento, passagem [pela polícia], não tem nada. Queria a explicação desse policial e o porquê ele fez isso", afirmou.

 

Ele determinou o afastamento de treze policiais que participaram da operação na Vila Clara e assinou um pedido de investigação rigorosa da Corregedoria da PM no caso. O Ministério Público também apura o caso

"Anos de legado da PM não podem ser manchados por condutas antiprofissionais. Policial não atira pelas costas em um furto sem ameaça à vida e não arremessa ninguém pelo muro. Pelos bons policiais que não devem carregar fardo de irresponsabilidade de alguns, haverá severa punição", escreveu Derrite.

 

Histórico do PM

O soldado da Polícia Militar que arremessou o entregador já foi indiciado por homicídio depois de uma ocorrência em que um homem foi morto com 12 tiros, em Diadema, Grande São Paulo, no ano passado.

Segundo a TV Globo apurou, o caso foi arquivado em janeiro deste ano depois que o Ministério Público se mostrou favorável ao arquivamento alegando que houve legítima defesa do policial durante troca de tiros. O juiz, então, aceitou o pedido.

Luan trabalha na Rondas Ostensivas com Apoio de Moto (Rocam), no 24º Batalhão de Polícia de Diadema. Nesta quarta-feira (4), a Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo pediu, à Justiça Militar, a prisão do agente. A informação foi confirmada por fontes do governo paulista.

O pedido partiu da Corregedoria após o órgão assumir o Inquérito Policial Militar (IPM) que tem este e outros policiais militares, envolvidos na ocorrência. A Justiça Militar decretou sigilo no inquérito.

Procurada pela TV Globo, a defesa de Luan informou que não vai se manifestar.

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) confirmou que o "agente responsável pela agressão foi ouvido e sua prisão foi solicitada à Justiça Militar".

A pasta informou que o "caso também é apurado pela Polícia Civil, por meio da Central Especializada de Repressão a Crimes e Ocorrências Diversas (CERCO) da 2ª Seccional. Diligências estão em andamento para a oitiva da vítima e o esclarecimento dos fatos".

 

Pedido de prisão

O pedido de prisão de Luan tem seis páginas e foi assinado pelo capitão Manoel Flavio de Carvalho Barros, encarregado do IPM. No documento, o oficial narra o início da ocorrência, com a perseguição a motociclistas. Em seguida, destaca cinco fotos feitas a partir de câmeras de segurança, que mostram a parte final da ação, quando o homem é jogado do alto da ponte.

O encarregado do inquérito, então, diz que, ao ser questionado sobre a cena, o soldado se reconhece e diz que “a projeção seria realizada ao solo”, ou seja, que o objetivo era jogar o homem no chão.

No parágrafo seguinte, o responsável pelo inquérito se dirige diretamente ao juiz: “Excelência, não há como acolher as declarações apresentadas pelo investigado, pois as imagens largamente difundidas e materializadas no presente feito demonstram conduta errante e inaceitável a quem deveria proteger a integridade de outrem e fazer cumprir a lei”.

Os crimes inicialmente imputados ao soldado são lesão corporal e violência arbitrária, todos previstos no Código Penal Militar.

O encarregado do inquérito termina dizendo que a prisão é a única forma de retomar a hierarquia e a disciplina e manter a ordem pública e social.

Pai de jovem arremessado por PM em SP fala sobre episódio — Foto: TV Globo

Pai de jovem arremessado por PM em SP fala sobre episódio — Foto: TV Globo

 

Flagrante

Um vídeo enviado à TV Globo flagrou o momento da abordagem. Nas imagens, que aparecem no começo desta reportagem, é possível ver que um policial levanta uma moto que está no chão. Um segundo e um terceiro policial se aproximam. Depois, o primeiro PM encosta a moto perto da ponte.

Um quarto policial chega segurando o homem pela camiseta azul, que seria o motociclista abordado. Ele se aproxima da beirada da ponte e o arremessa no córrego. Nenhum dos colegas faz nada.

Uma testemunha, que preferiu não se identificar, relatou ao Jornal Nacional que os policiais estavam no bairro para dispersar moradores de um baile funk.

 

"Tinham dois policiais da Rocam parados ali, com cacetete na mão, esperando para abordar. Aí esse menino veio da avenida, virou e aí foi a hora que ele viu os polícias e caiu no chão com a moto. Na hora em que ele caiu no chão com a moto, policiais vieram em cima dele. Eu e minha amiga saímos correndo", afirmou.

 

Vídeo mostra momento em que PM joga homem de ponte durante abordagem em SP — Foto: Reprodução/TV Globo

Vídeo mostra momento em que PM joga homem de ponte durante abordagem em SP — Foto: Reprodução/TV Globo

 

13 PMs afastados

De acordo com a Polícia Militar, os agentes são do 24º BPM de Diadema, na Grande São Paulo. Os 13 policiais afastados das ruas estão envolvidos direta ou indiretamente no episódio, segundo a Corregedoria.

Todos os PMs usavam câmeras corporais e gravaram a abordagem. Essas imagens serão usadas pelos investigadores para entender os detalhes da ocorrência.

 

O que dizem as autoridades

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), disse, em uma rede social, que o policial militar que "atira pelas costas" ou "chega ao absurdo de jogar uma pessoa da ponte" não está à altura de usar farda. Disse ainda que o caso será investigado e "rigorosamente" punido.

O secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite (PL), também criticou a ação do policial militar.

"Anos de legado da PM não podem ser manchados por condutas antiprofissionais. Policial não atira pelas costas em um furto sem ameaça à vida e não arremessa ninguém pelo muro. Pelos bons policiais que não devem carregar fardo de irresponsabilidade de alguns, haverá severa punição", escreveu em uma rede social.

Ao falar de policial que "atira pelas costas", Derrite se referia a um segundo ato de violência policial na capital paulista nos últimos dias. Um PM que não estava fardado executou um jovem negro em frente a um mercado, atirando pelas costas da vítima.

O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa – principal representante do Ministério Público paulista, também emitiu uma nota pública de repúdio à cena, e disse que as imagens são “estarrecedoras e absolutamente inadmissíveis”.

Ele afirmou que já designou que o Grupo de Atuação Especial de Segurança Pública (Gaesp) integre as investigações a fim de “punir exemplarmente” os policiais envolvidos na abordagem.

 

Por Lucas JozinoIsabela Leite, TV Globo e GloboNews — São Paulo

 

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